Letras, minha formação.
Aprendi a amar as palavras desde cedo. Pelo som, pelo significado ou pelo que
eu ignorava delas. Aprendi também o valor das palavras na busca de meus objetivos.
Tenho quatro irmãos, todos
mais fortes do que eu. Então quando eu queria tirar alguma coisa deles, de
maneira nenhuma poderia usar a força, seria surra na certa. Eu também não sabia
discutir. Recorria sempre à sutileza da palavra, ao convencimento pela linguagem.
Eu os observava durante todo o dia, seus gestos, humor, até definir que
palavras usar, o tom de voz e o momento certo de atacar. Batata! Sucesso em 99%
das tentativas. Minha força era a linguagem.
E assim cresci e fui
conquistando meu espaço. Por vocação, eu queria ser jornalista. Mas por não
haver este curso próximo à minha cidade, minha mãe sugeriu que eu fizesse
Letras. Amei o curso e consegui novas armas paras as minhas batalhas.
Aos 36 anos de idade, já
bastante íntima das palavras, tive um filho. Um lindo menino que demorou a
falar. Eu pensava: falar é difícil mesmo! Mas fui percebendo que não era só
falar que ele não sabia, era interagir, se comunicar por outras formas. Veio o
diagnóstico: autista savant. Meu filho era um gênio aprisionado em um mundo
particular.
E agora: eu que tanto
apreciava a linguagem, estava diante da incógnita de um filho que vivia num
mundo sem interação. Que armas usar para essa batalha? Minhas palavras não
faziam o menor sentido para ele. Eu não conseguia me comunicar, ensinar...
nada. Era só silêncio.
Então fiz o que qualquer mãe
faria: demonstrei meu amor através de abraços, beijos, carinho e dizia,
frequentemente, eu te amo. As primeiras palavras, faladas e lidas por ele,
vieram aos três anos de idade: papai, mamãe, água.... Muitas eram ditas fora de
contexto, mas eu as amava assim mesmo.
Passaram os dias, entre
poucas palavras e muitos gestos de amor, meus e dele. Amar era tudo o que eu
podia fazer. Meu domínio da linguagem não tinha nenhum valor para meu filho. Eu
tive que aprender junto com ele um novo tipo de comunicação... e aprendi.
Até que aos 4 anos,
finalmente, ele olhou pra mim e disse sua primeira frase: Te amo.
Denizia Moresqui
06/12/2016
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