quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

HISTÓRIA DE ITAMBÉ - PARTE 1







  ÍNDICE
Populações indígenas do Ivaí
O Caminho de Peabiru
Tratado de Tordesilhas
Província del Guairá e Vila Rica do Espírito Santo
Colônia Thereza Christina
Novas Correntes Colonizadoras
A Guerra do Contestado


                                        HISTÓRIA DE ITAMBÉ

                                     “Omnia fert non aetas.”

“O tempo não leva tudo.”
(Provérbio Latino modificado)

           É natural do ser humano o desejo de deixar sua marca na Terra, registrar sua passagem pelo mundo. Esse foi um dos motivos da invenção de escrita; traçando os sons, o Homem pôde escrever sua história e valorizar sua cultura. Até hoje, nota-se que os povos mais respeitados são aqueles que deixaram escrita sua trajetória. Além disso, esta é a forma mais segura de que o tempo não leve tudo, não apague o que homens, mulheres, jovens, idosos e crianças fizeram, viveram e sonharam. O ser humano é o que ele vive e escreve. É a partir do registro da palavra que se firma a identidade de um povo.
           Tendo em vista importância do registro histórico escrito para a valorização do povo itambeense, no ano de 2010, a Prefeitura Municipal, empreendeu uma grande pesquisa em busca das histórias que deram origem a Itambé. O objetivo do trabalho foi voltar às raízes do Município para tornar públicos os fatos conhecidos por pioneiros que desbravaram o “Solo Rico do Vale do Ivaí” até chegar à atualidade.
        Quatro anos após o início do trabalho, a Divisão Municipal de Cultura chegou a este documento que pretende descortinar os fatos que formaram o povo e a cultura itambeenses. As informações aqui expressas provêm de pesquisas bibliográficas, tanto em livros, documentos, trabalhos acadêmicos, quanto em sites, blogs, e testemunhos. Como seria impossível entrevistar todos que contribuíram e/ou contribuem para a formação histórica deste Município, foram entrevistadas, por amostragem, pessoas de várias profissões, classes sociais, idades, credos e etnias. Dessa forma, houve a possibilidade de narrar os acontecimentos sob diversos pontos de vista para garantir a máxima fidelidade dos fatos.
        O texto foi dividido em três épocas históricas: inicia-se no século XVI, com os índios e os primeiros colonizadores espanhóis que fundaram a Província de Guairá no local que atualmente é o território paranaense, até o Povo Sutil, caboclos que moraram nas terras itambeenses; a segunda parte tem início com o Distrito de Itambé até a Geada Negra; a última parte trata das mudanças pelas quais o Município passou após o êxodo rural e chega-se à atualidade.
        Como a história é dinâmica e não estática, este documento pretende fomentar nos leitores o desejo de saber mais sobre Itambé e, assim, fazer surgir outros fatos a respeito deste Município. Para que, na próxima edição, haja mais personagens e episódios a serem conhecidos. Além disso, a cada dia, os itambeenses construirão novos capítulos que poderão fazer parte das “Histórias de Itambé”.
        Este esforço tem por meta não deixar perdidos no tempo lembranças tão importantes para as atuais e futuras gerações se espelharem e traçarem seu destino.  Porque:

                               Discipulos est prioris posterior dies.”
                                                                                                   P. Siro
                    
                 “O tempo passado é o mestre do presente e do futuro”.


     PARTE 1 – ÍNDIOS E EUROPEUS NO VALE DO IVAÍ

                                POPULAÇÕES INDÍGENAS DO IVAÍ

               A água é fundamental para a existência de vida. Itambé é banhado por três rios: Keller, Marialva e Ivaí, além de vários córregos e nascentes, portanto, um local propício para que haja vida em abundância. O mapa hidrográfico do Município revela inúmeros percursos hídricos, o que tornou o solo ainda mais rico. Sendo assim, havendo água e alimento, formaram-se aqui condições ideais para que os povos pré-históricos e índios estabelecessem suas tribos. A história de Itambé teve início muito antes do Século XX. O que teria atraído tantos povos para cá, sem dúvida, foi o Rio Ivaí, o maior rio a banhar Itambé. 
                        Mapa Hidrográfico de Itambé
                        Fonte: Prefeitura Municipal de Itambé

            Ivaí é uma palavra indígena e pode significar “riacho de frutas”, em tupi-guarani, ou de acordo com a etimologia de D. Pedro II, Rio das Árvores ( Ivahy – ibá ou ubá: árvore, madeira; hi: água, rio). O Ivaí surge da confluência das águas de dois rios em Prudentópolis: o Rio São João, que nasce em Manoel Ribas, e o Rio dos Patos, cuja nascente está no limite dos municípios de Inácio Martins e Prudentópolis, na Serra da Esperança. Suas águas percorrem o Paraná por seiscentos e oitenta e cinco quilômetros, sua bacia hidrográfica é de 35.845 km2, com mais de cem afluentes, além de córregos ainda não resgistrados. O Ivaí banha Itambé por trinta quilômetros.

            Este rio já foi conhecido por outros nomes. Os índios inicialmente o chamavam de Tucuari, os padres jesuítas espanhóis, de Huybay, Rui Diaz Gusmán, neto de Domingos de Yrala, governador do Paraguai, chamou-o de Ubay, o rio também foi conhecido como Ubatuba, que significa muito pinhão, e ainda foi denominado Rio de Dom Luís, pelo Capitão Estêvão Ribeiro Sayão, sob a ordem expressa do próprio Dom Luís, com a finalidade de firmar posse das terras paranaenses. Em 1769, escreveu D. Luís Antônio Botelho de Souza Mourão, o Morgado de Matheus, Capitão General e Governador da Capitania de São Paulo entre 1767 e 1775, a seu primo Afonso Botelho de San Paio e Souza, comandante da Praça de Paranaguá:
Site pesquisado em 07/04/2014

         “Já avisei a vmce. que o rio chamado de Ubatuba (Ivaí), mande vmce. que se chame de Dom Luís de Matheus daqui por diante; em outro ponha vcme. o seu nome e em todos nomes de nossas casas, e apelidos mais conhecidos, de sorte que fique bem estampada a memória dos autores deste descobrimento, para os tempos futuros... Nomes que nos possam resistir à fatalidade do esquecimento do tempo” (carta de 4 de outubro de 1769)

(Fernandes, 2006, pag. 85)

                                Detalhe do Mapa: Rio Ivaí com o nome de
                                Rio de Dom Luís

            Mas as pretensões de D. Luís de resitir ao esquecimento foram frustradas. Pois o nome que prevaleceu até os dias de hoje no rio foi Ivaí.
            No livro LENDAS E CONTOS POPULARES DO PARANÁ, lançado pela Secretaria de Estado de Cultura em 2005, há duas lendas sobre o Ivaí, uma correspondente ao nome do rio e outra sobre a sinuosidade de seu leito.  Segundo uma delas, recolhida em Rio Branco do Ivaí, uma índia aparecia aos canoeiros e os condizia por lugares cheios de pedras, dizendo: “Vai por aí”, mas ela dificultava a navegação e os prendia nas pedras. Então, amedrontados, quando contavam o fato aos outros, acabavam juntando as palavras da frase pronunciada pela índia e diziam: ivaí, que significava: índia-vai-aí. Assim o rio teria sido nomeado. Outra lenda transcrita no livro sobre este rio, recolhida em Lindianópolis, relata que uma divindade pediu para uma mulher que ela seguisse em frente, pela margem do rio, sem olhar para trás. Mas ela não obedeceu à divindade e a cada vez que olhava para trás, se desviava e o rio ficou torto como o caminho percorrido por ela. Em Itambé, existe a lenda do Caboclinho D’Água, segundo a qual, um menino que vivia dentro do Rio Ivaí, muitas vezes, virava os botes dos pescadores, afugentando-os.
 Confluência do Rio São João com o Rio dos Patos: nascente do Rio Ivaí. Prudentópolis, PR
 Fonte: Google Mapas

           De acordo com estudos realizados por Mota e Novak (2008), a bacia do Rio Ivaí é habitada por populações distintas há cerca de 8.000 anos. Estes estudos foram baseados em escavações arqueológicas feitas desde 1958 e divulgadas pelo Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná. Os arqueólogos denominaram povos que habitavam no que hoje é o Estado do Paraná como “caçadores e coletores pré-cerâmicos” (Mota e Novak, p. 20) e os dividiram em três categorias: Humaitá, que viveram nos vales dos grandes rios; Umbu, moradores de terras altas, e Sambaqui, povos litorâneos. Na região do Vale do Ivaí, foram encontrados vestígos dos Umbu. Em Itambé, de acordo com o LAEE (Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-História da UEM) houve a descoberta de um sítio arqueológico na foz do Rio Marialva.
                    Os povos pré-ceramistas foram substituídos por índios Kaigang, Guarani, Xetá, e Xokleng, agricultores e ceramistas, há 3.000 anos. A maior população no trecho do Rio Ivaí em Itambé era de Guarani. De acordo com vários pioneiros, peças indígenas eram encontradas em todos os lugares onde havia água: rios, córregos e nascentes. Porém diversos pioneiros quebravam as peças temendo que os índios voltassem para reavê-las. Apesar de não haver mais nenhum índio aqui quando os primeiros colonos chegaram. Assim muitas peças se perderam. Houve, no entanto, algumas famílias que perceberam o valor histórico das cerâmicas e pedras manipuladas pelos indígenas e as guardaram. 

                                Peças indígenas encontradas às margens do Rio Ivaí, em Itambé
                                Foto: Denizia Moresqui

          Entre as peças encontradas, há vasilha de cerâmica e peças líticas, como: lâminas de machado, mãos de pilão, pontas de lança, pilões, entre outras.             
             De acordo com o Professor de História Lúcio Tadeu Mota, da Universidade Estadual de Maringá, geralmente as populações indígenas gostavam de lugares às margens dos rios, principalmente locais com corredeiras. Eles faziam suas aldeias em pontos altos para se protegerem de enchentes e entre águas pequenas. Sendo assim, o local onde foi estabelecido o Bairro Catarinense foi ideal para que uma tribo de indígenas vivesse e foi o que aconteceu até o século XVII. Visualizando o local pelo Google Heart, o Prof. Lúcio explicou que, nas corredeiras do Rio Ivaí, próximo ao Porto Figueira, os índios provavelmente faziam armadilhas para os peixes, quando o rio estava baixo, no inverno.
                      Bairro Catarinense, seta: local apontado pelo Prof. Lúcio T. Mota no qual,
                      provavelmente, os índios construíram sua aldeia
                      Fonte: Google Mapas
       
            Além disso, o pioneiro Argentino Bianchessi ainda relata que a cinquenta centímetros da superfície da terra, foram encontrados pedaços de carvão vegetal, como se alguém tivesse feito pequenas fogueiras no terreno, outro vestígio de vida humana. Por fim, pedaços de cerâmica estavam espalhados pelos lotes de terra, à beira do Rio Ivaí e nascentes. Mas quando o município começou a ser colonizado em 1947, não havia tribos estabelecidas aqui, só índios de passagem.
            Outras peças foram encontradas na zona rural de Itambé pela família Ueoka: lâmina de machado, pilão e outras peças líticas. Isto mostra indícios de que o território onde hoje é Itambé foi amplamente habitado por indígenas.

                   Peças encontradas próximas a uma nascente, por família Ueoka

                            Foto: Denizia Moresqui

              Na Gabirobeira, foi encontrada uma peça lítica que, provavelmente, servia para amassar ervas a fim de fazer remédios. A mesma serviu de peso de porta para uma família residente daquele local durante muitos anos, até ser doada para a Divisão Municipal de Cultura, em 2011. Neste local, ainda havia outros vestígios de povos indígenas. José Carlos Nardi afirma ter encontrado duas pedras de pontas, parecidas com lanças.
                                Peça encontrada na Gabirobeira
                                Foto: Denizia Moresqui

            Por volta de 1968, Genésio Higino Pereira Mendes viu uma oficina lítica dentro do Rio Ivaí, próximo à foz do Rio Keller. A peça de baixo era usada para moldar mãos de pilão e a de cima era a mão que estava sendo moldada. Os índios colocavam ambas dentro do rio e, com areia, água e fricção, davam forma às peças. Uma peça como esta necessitava de muitos meses ou até anos de trabalho para ficar pronta. O índio que moldava a peça encontrada por Genésio não terminou o serviço. Pode ter sido morto, escravizado ou fugiu dos colonizadores espanhóis ou portugueses.

                  Peças encontradas no leito do Rio Ivaí, foz do Rio Keller,

                           por Genésio Higino Pereira Mendes
                           Foto: Denizia Moresqui

                 Além destas, José Carlos Nardi disse que no desmatamento de 60 alqueires às margens do Rio Ivaí, em 1966, feito pelas famílias Schlatter e Bernardino na localidade Três Marcos, foram encontradas panelas e outros utensílios de cerâmica e peças líticas.

                                         O CAMINHO DE PEABIRU

          Os índios da América Latina não viviam isolados em suas tribos, viajavam, guerreavam e comercializavam uns com os outros. Para tanto, foram muitos caminhos antes da colonização europeia. O principal deles ligava o Peru ao litoral de São Paulo, conhecido como Caminho de Peabiru. Do tupi-guarani, Peabiru significa: “pe” caminho e “biru” gramado amassado. Pois, os Guaranis plantavam uma gramínea conhecida como puxa-tripa pela trilha, para impedir que a mata a encobrisse.  Tendo um metro e quarenta de largura, a trilha estendia-se por três mil quilômetros no meio da mata virgem e passava pela Bolívia, Paraguai e Paraná. Seu tronco principal cruzava o Estado do Paraná de Leste a Oeste.
         Sua importância histórica foi guiar as migrações indígenas e facilitar, mais tarde, a circulação de mercadorias, o comércio e as missões religiosas. Além disso, este caminho foi o principal acesso à região Sul do Brasil. Sua criação é atribuída aos povos Incas ou aos Guaranis.
                                Caminho de Peabiru e principais ramais
                                Fonte: Google Imagens
                
            Segundo estudiosos, a verdadeira história deste caminho ainda é um mistério. No entanto, uma das teorias mais aceitas é que ele seja a mais curta e melhor rota entre os oceanos Pacífico e Atlântico, sendo usado como intercâmbio cultural e na troca de mercadorias pelos indígenas.  Uma lenda diz que, aconselhados pelos deuses, os Guaranis teriam aberto a trilha em busca de uma “terra sem mal”. Esse território seria a morada de seus ancestrais e era descrito como um local onde as roças cresciam sem a necessidade de serem cultivadas e onde não existia a morte. De acordo com o Professor Samuel Guimarães da Costa,( no site pesquisado em 2012, http://www.caminhodepeabiru.com.br/ocaminho.htm), o Paraná seria este paraíso. Tendo em vista a fertilidade das terras paranaenses, esta lenda tem fundamento. Ainda há a lenda do Pai Zumé, segundo a qual um homem extraordinário percorreu a América do Sul pregando o Evangelho; ele teria ensinado aos índios como utilizar a mandioca e a erva-mate. Pai Zumé ainda profetizou a vinda de missionários que diriam as mesmas coisas que ele e o fim da Província del Guayra, que ainda nem existia. Diz a lenda ainda que no caminho percorrido por ele, não crescia mais a mata, daí teria surgido o Caminho do Peabiru, chamado mais tarde pelos jesuítas de Caminho de São Tomé.  Quando estes padres souberam da lenda, acreditaram que o tal Pai Zumé seria São Tomé, apóstolo de Jesus Cristo, que viera a este continente evangelizar os indígenas. Estudos revelam que Zumé ou Zome vem da palavra Haitiana Zemi, que significa divindade ou pessoa divinizada. No Paraguai, os índios chamavam de Paizumé os sacerdotes.

                     Caminho de Peabiru no Paraná e principais ramificações


           Uma das ramificações do Caminho de Peabiru cruzava o Rio Ivaí próximo à região do Município de Floresta. Sendo assim, é possível acreditar que os índios que viviam nas terras de Itambé também podem ter usado este caminho.   
            Porém, não foram apenas os nativos que usaram o Peabiru. No século XVI, ele seria percorrido também por estrangeiros. Pois, do outro lado do Oceano Atlântico, a história dos povos indígenas estava sendo traçada por mãos europeias.
 
                                     TRATADO DE TORDESILHAS
                               Assinatura do Tratado de Tordesilhas
                              Fonte: http://historiaoitavo.blogs.sapo.pt/14544.html
                              (site pesquisado em 2011)

                   A paz dos povos indígenas da bacia do Ivaí começaria a ser ameaçada em 1494, com o Tratado de Tordesilhas. Após o descobrimento da América, por Cristóvão Colombo, Portugal e Espanha, grandes navegadores e descobridores de terras da época, começaram a travar disputas por territórios. Para evitar que as duas nações entrassem em guerra, o Papa Alexandre VI interveio com a expedição de bulas fixando limites de exploração para os dois países. Sendo assim, as terras já descobertas ou por descobrir ao sul do Caribe seriam divididas da seguinte forma: uma linha imaginária foi traçada a 100 léguas de Cabo Verde. As terras a Oeste da linha seriam da Espanha e a Leste, de Portugal. Todo o território de povos não cristãos poderia ser invadido pelas duas potências.
                   Porém, quando os dois países assinaram o Tratado, em 7 de junho de 1494, na cidade de Tordesilhas, no Noroeste da Espanha, as delimitações foram modificadas por insistência de Portugal, provavelmente porque os portugueses já sabiam da existência das terras a Oeste do Hemisfério Sul. A linha divisória foi demarcada a 370 léguas de Cabo Verde. O Oriente ficou com Castela (Espanha) e o Ocidente com Portugal.
                                Demarcações do Tratado de Tordesilhas
                                Fonte: Google Imagens

             Sendo assim, em 1500, quando os Portugueses chegaram oficialmente à América Latina, o novo território deveria ser dividido da seguinte maneira: o litoral entre o Pará e Santa Catarina seria de Portugal e o restante das terras, da Espanha, que levou vantagem, visto que seu território era muito maior que o de Portugal, concentrando mais da metade do que hoje é o Brasil, além de todos os países da América do Sul e Central, além do México.
             Os exploradores espanhóis cruzavam o Oceano Atlântico e alcançavam a foz do Rio de la Plata, entre o Uruguai e a Argentina. Então subiam até o Rio Paraná, navegavam pelos rios Piquiri e Ivaí, passando pelo território onde atualmente é Itambé. Havia a possibilidade de navegarem também pelos rios Iguaçu, Tibagi, Paranapanema e Tietê. Os rios eram literalmente as rodovias espanholas, portuguesas e indígenas.
                               Acesso dos Espanhóis pelo Rio de la Plata
Fonte:http://sosriosdobrasil.blogspot.com.br/2009/10/mudanca-climatica-e-apenas-uma-causa-da.html

         Mas o que isto tem a ver com a história de Itambé? Pelo Tratado, as terras onde hoje se encontra este Município pertenceram à Espanha e eram administradas pelo governo do Paraguai. Em 1608, o rei da Espanha criou uma província que hoje corresponde a quase todo o Estado do Paraná denominada Província del Guayrá. O nome vem de um cacique da região da foz do Rio Piquiri chamado Guayrá, que quer dizer “terra de jovens” ou de outro cacique chamado Guayracá, que significa “esta terra tem dono”. Neste local onde foi erguida a Ciudad Real del Guayrá. Mesmo esta terra já tendo dono foi tomada pelos espanhóis. O quase território paranaense fazia parte do Paraguai, incluindo as terras de Itambé.

                             Mapa do Paraguai incluindo a Província Del Guayra (hoje Paraná)
                             Fonte: Prof. Me. Roberto Bondarik. UFTPR

PROVÍNCIA DEL GUAIRÁ E VILA RICA DO ESPÍRITO SANTO
                               Paraná Espanhol
                               Fonte: Google Imagens

Localização do Parque Estadual de Vila Rica do Espírito Santo
                               Fonte: Prof. Me. Roberto Bondarik  

             Sabendo que os portugueses não respeitariam o Tratado de Tordesilhas facilmente, os espanhóis sentiram a necessidade de habitar as terras que lhe cabiam. Então, desbravadores desta nação iniciaram a exploração. Aleixo Garcia empreendeu a primeira expedição pelo território que hoje é o Paraná. Interessado nas peças de ouro encontradas no litoral de Santa Catarina, Garcia viajou por três anos, seguindo o Rio Iguaçu, passou pelo Paraguai, Bolívia e chegou ao Império Inca pelo Caminho de Peabiru. Na volta, foi morto pelos índios Guaranis, próximo onde hoje se encontra Foz do Iguaçu, em 1525. Depois de Garcia, Pero Lobo, em 1531, também fez uma expedição pelo interior da, ainda não criada, Província del Guayrá, possivelmente seguiu a mesma rota de Garcia e teve o mesmo fim, foi morto pelos Guaranis da foz do Rio Iguaçu.
             Então, dez anos depois, para tomar posse da província do Paraguai em nome do rei da Espanha, Alvarez Nuñes Cabeza de Vaca também passou pelas terras do atual território do Paraná. Porém tomou caminho diferente de Garcia e Lobo. Saindo de Santa Catarina, subiu pelo Rio Tibagi, seguiu a oeste passando pelo Rio Ivaí e Piquiri, desceu até o Rio Iguaçu, próximo à sua foz no Rio Paraná e seguiu para Assunção, escapando da morte nas mãos dos índios. A viagem durou cerca de quatro meses e, em seus relatos, Cabeza de Vaca registrou a presença de habitantes indígenas em quase todo o território do Paraná.
           
                                                        Espanhóis e índios no Guairá

                                                          Fonte: Google Imagens

        Para intensificar a presença espanhola no continente, o novo governador do Paraguai, Domingos Martinez de Irala, em 1544, fundou a cidade de Ontiveiros às margens do Rio Paraná, próximo à foz do Iguaçu e apresou índios para as “encomiendas”. De acordo com este sistema, os índios eram confiados pelo rei ou governador a colonos espanhóis e aos seus descendentes pelo prazo de duas ou três gerações. Os indígenas trabalhavam para os colonos num regime de escravidão, que os instruíam na fé católica e os protegiam. Ao final do prazo, ficavam livres.

                                Ruy Dias Melgarejo, fundador da Vila Rica do Espírito Santo
                                Fonte: Google Imagens

             Em 1553 ou 1554, Ruy Dias Melgarejo, que participou da expedição de Cabeza de Vaca, voltou a percorrer o interior do Guairá, de Ontiveiros até São Vicente, em São Paulo. Melgarejo fundou duas cidades no Guairá: Ciudade Real del Guayrá, hoje município de Terra Roxa, e, em 1570, Villa Rica del Spiritu Sancto, que foi fundada onde hoje é município de Nova Cantu, mas devido a uma peste, esta cidade foi mudada para a foz do Rio Corumbataí, entre 1578 e 1595, no município de Fênix, que tem limite com Itambé. A área desta cidade era de aproximadamente 300.000 m2, e chegou a ser habitada por 10.000 pessoas. Ao seu redor havia chácaras onde os índios e colonos plantavam para sua subsistência, cultivavam também a erva-mate como atividade econômica.  

               Proximidade de Itambé com a Vila Rica do Espírito Santo: cidade: 28 Km, Município: 5 Km

                                                   Fonte: Prof. Me. Roberto Bondarik
    
        Vila Rica tem importância para a história de Itambé tendo em vista que, pela proximidade desta cidade com as terras onde hoje se encontra este município, os índios que aqui viviam, certamente fizeram parte das “encomiendas” espanholas. Como já fora mencionado, vestígios dos índios “itambeenses” foram encontrados em vários sítios e fazendas às margens do Rio Ivaí. O Senhor Argentino Bianchessi, conhecido como Gentil, relata que ao chegar ao local onde seria estabelecido o Bairro Catarinense, havia lá uma trilha no meio da mata com cerca de um quilômetro e, no fim desta, ele encontrou dois pés de limão galego. O limoeiro não é uma árvore nativa do Brasil e sim da Ásia e foi trazido a este país por colonizadores portugueses e espanhóis. O Prof. Lúcio Tadeu Mota disse em entrevista a esta publicação que, pela proximidade com Vila Rica, provavelmente, foram os espanhóis que trouxeram as sementes dessas plantas até Itambé no século XVI. Sendo assim, os limoeiros encontrados pelo Senhor Gentil são um indício de que o povo ibérico também cultivou as terras de Itambé há quinhentos anos.

                                Índios trabalhando para os espanhóis

                                Fonte: Prof. Me. Roberto Bondarik


      Devido à peste que os espanhóis enfrentaram na região de Nova Cantú, eles sabiam que a aglomeração de pessoas poderia transmitir mais facilmente  doenças. Segundo estudos realizados pelo Prof. Ananias Soares Vieira, quando era acadêmico do curso de Geografia, na região onde hoje é o município de Fênix, vivia a elite espanhola, do outro lado do Rio Ivaí, região de Itambé e São Pedro do Ivaí, moravam os índios escravizados. Assim a Vila Rica do Espírito Santo não se limitou apenas num pequeno campo, mas espalhou-se ao longo do Rio Ivaí, por um raio de, aproximadamente, 50 quilômetros, o que inclui a região de Itambé nas terras exploradas por estes colonizadores.

                                Maquete dos contornos de Vila Rica, exposta no Museu Paranaense

                                Foto: Prof. Roberto Bondarik

          Mas os colonos espanhóis se depararam com três problemas sérios no Guairá. Bandeirantes paulistas começaram a invadir a região de terras pertencentes à Espanha em busca de índios para o trabalho escravo. Além disso, o grupo de indígenas era muito maior que o de espanhóis. Em Ciudade Real havia 30 colonos, em Vila Rica, 100 colonos e nestas regiões, 150.000 índios. Outro problema foi a revolta dos índios contra o sistema de “encomiendas” e o domínio espanhol em seus territórios. Diante das dificuldades de submeter os nativos e para impor a soberania espanhola sobre as terras à Ocidente do Rio Paraná, Hernando Arias Saavedra, governador do adelantado de Assuncion, aconselhou o Rei da Espanha que passasse aos padres jesuítas espanhóis a tarefa de pacificar e catequizar estes povos para depois seriam entregues aos colonos e servirem como escravos. As reduções levavam este nome porque o objetivo das mesmas era “reduzir” os nativos e prepara-los para serem vendidos ou escravizados. Mas, como se verá mais adiante, as reduções se tornaram redutos de proteção aos índios. Além disso, em 1608, fora criada Província del Guayrá, que corresponde ao que hoje é quase todo o Estado do Paraná, numa tentativa de conter o avanço português.


                        Ruínas de Missão Jesuítica de São Miguel das Missões-RS
                               Foto: Denizia Moresqui
       
         No Guairá foram fundadas quinze Reduções Jesuíticas: Nossa Senhora de Loreto, Santo Ignácio Mini, São Francisco Xavier, Nossa Senhora da Encarnação, São José, Sete Arcanjos de Taioba, São Paulo de Ivaí, Santo Antônio, São Miguel, Jesus Maria, São Tomé, São Pedro, Santa Maria, Concepcion e Nossa Senhora da Conceição. Nelas, os índios eram catequizados na fé católica, viviam livres e mantinham vários de seus costumes. Por isso, até tribos mais arredias se achegavam para viver nas reduções. As terras eram de todos, assim como as lavouras de mandioca e milho. Havia ainda criação de gado, coleta e produção de erva-mate para a exportação à região do Prata, Argentina. Desde a criação dos filhos até o cultivo da lavoura era feito de forma coletiva. Para transitar entre as reduções, os padres jesuítas possivelmente utilizavam os rios, o que os índios já faziam antes.  De acordo com o historiador Lúcio Tadeu Mota, da Universidade Estadual de Maringá:

      "A comunicação das Reduções das margens do Paranapanema com as localizadas ao sul na região dos rios Corumbataí e Ivaí, ou vice-versa, podiam ser feitas subindo o rio Pirapó, até os ribeirões Maringá-Mandacaru, Morangueira ou Sarandi, e por estes chegar até o platô onde está Maringá, para descer pelos córregos Borba Gato, Cleópatra e Mascado até o ribeirão Pingüim e por este até o rio Ivaí, em direção à cidade espanhola de Vila Rica do Espírito Santo ou às Reduções do Ivaí e Corumbataí. Uma outra rota possível seria subir o rio Pirapó até suas cabeceiras no rio Dourados, até alcançar o platô onde está Mandaguari e descer pelo rio Keller até o Ivaí. Com toda certeza essas rotas eram conhecidas e utilizadas pelos índios e delas se aproveitaram os padres jesuítas nas suas andanças e pregações nas aldeias da região."   
                 
(Site pesquisado em 2011)

                                Fonte: Google Imagens

         Porém, tanto as cidades espanholas quanto as reduções jesuíticas acabaram decretando a quase extinção dos índios. No lado português do Brasil, nas capitanias hereditárias, a falta de mão de obra era um grande empecílho ao crescimento econômico dos fazendeiros. Havia a necessidade de encontrar pessoas que trabalhassem naquelas terras. Onde encontrar mão de obra? Nas cidades e reduções pertencentes à Espanha. Pois assim não seria preciso pegar os índios na floresta em pequenas tribos, eles já viviam em grandes comunidades, estavam acostumados ao trabalho na lavoura e a civilização.
                                Batalhas entre índios e bandeirantes no Guairá
                                Fonte: Google Imagens

                                Rotas dos Bandeirantes nas terras espanholas
                                Fonte: Google Imagens

           Então, em 1607, Manoel Preto, um grande predador de índios, foi até as proximidades de Vila Rica do Espírito Santo, no centro da bacia do Rio Ivaí, provavelmente, passou pela região onde hoje é Itambé, e aprisionou muitos índios Guarani. Mesmo com a criação da Província del Guayrá pelo Rei da Espanha, para conter o avanço português, Manoel Preto e Raposo Tavares, voltaram ao Guairá em busca de mais índios de 1611 a 1628. Em agosto deste último ano, São Vicente, atual Estado de São Paulo, decretaria o fim da Província del Guayrá sem que nada fosse feito pelo novo governador do Paraguai, Don Luis de Cépedes y Xerya.
          Os padres eram contra o sistema de “encomiendas” e se recusavam a entregar os índios refugiados nas missões, assim, nas colônias faltava mão de obra. Havia ainda boatos de que os religiosos pretendiam criar um Estado livre da Espanha e de Portugal, a República Guarani. As queixas dos colonos chegaram ao conhecimento de Luis de Cesperez y Xérya, quando este visitou Vila Rica. Além disso, o governador tinha interesses particulares em levar os índios para serem escavizador nas lavouras de cana do território Português, São Paulo e Rio de Janeiro. Ele casou-se com D. Vitória de Sá e recebeu como dote engenhos na Ilha do Governador, então precisaria de escravos para si e para seus novos parentes. Sendo assim, o próprio Governador dera permissão a Raposo Tavares para capturar índios no Guayrá. Novecentos homens brancos e cerca de três mil índios formaram um exército comandado por quatro bandeirantes: Antonio Raposo Tavares, Pedro Vaz de Barros, Brás Leme e André Fernandes.
                                Cruz Jesuítica – São Miguel das Missões-RS
                                Foto: Denizia Moresqui

           Os primeiros embates aconteceram na Redução de Encarnacion, no Rio Tibagi, depois foi a vez de San Antônio. Com o pretexto de capturar índios que fugiram dos bandeirantes e se esconderam na missão, Raposo Tavares ataca San Antônio, mata centenas de índios, aprisiona 2000 e, a 30 de janeiro de 1629, acaba a batalha com a destruição da missão.

                            Província del Guayrá – Cidades espanholas e reduções jesuíticas

                            Fonte:Google imagens

                 Depois de arrasar San Antônio, Raposo Tavares desce pelo leito do Rio Ivaí para atacar as outras reduções. E assim, uma a uma, as missões caem nas mãos dos bandeirantes: San Tomas, San Pablo, Los Angeles, Jesus-Maria. Na região de Itambé, só sobraram utensílios domésticos e armas feitos em pedras pelos índios. Um grande massacre manchou as terras das margens do Rio Ivaí. Tavares arrasa também as missões de outros rios do Guairá, como: San Miguel, Encarnacion e Arcangelos. Assim em maio de 1629, após dez meses de lutas, Raposo Tavares volta com seu exército e leva cerca de 20 mil índios escravizados para a Vila de São Vicente. Dois padres jesuítas, Mancilla e Mazzeta, acompanharam a comitiva e relataram esta experiência na “Relacion de los Agravios”, na peça escreveram que as crianças e os velhos ficaram para trás no caminho e, para não atrasarem a viagem, foram assassinados pelos bandeirantes. Estes, ao chegarem à Vila de São Vicente, foram recebidos como heróis. Até hoje, Raposo Tavares e os Bandeirantes são homenageados tendo seus nomes destacados em praças, ruas e rodovias. Torna-se o herói da história quem a escreve.




                                                                      Raposo Tavares
                    Fonte: http://www.historiabrasileira.com/brasil-colonia/antonio-raposo-tavares/

                Há provas históricas de que Raposo Tavares passou pelo território onde hoje é Itambé quando veio à Província del Guayrá destruir as cidades espanholas. De acordo com informações publicadas no blog do Professor Arthur Barthelmess,( pesquisado em 2011: http://arthur-barthelmess.net/index.html) a parte do Rio Ivaí navegável é de sua foz até a embocadura do Rio Corumbataí, onde se encontrava a cidade de Vila Rica. Para chegar às cidades espanholas, foram construidas centenas de canoas pequenas com troncos de cedro, aqui mesmo no Paraná, e assim os bandeirantes, mamelucos e tupiniquins puderam descer os rios Ivaí e Paraná e alcançar as duas cidades. Em 1632, Vila Rica do Espírito Santo foi sitiada pelos bandeirantes por três meses. Muitos de seus moradores fugiram para a margem oeste do Rio Paraná, onde fundaram outra Vila Rica que existe até hoje no Paraguai. Outros vilariquenhos aliaram-se aos bandeirantes e mudaram para São Paulo, onde ajudaram a fundar as cidades de Sorocaba e Santana de Parnaíba. Os moradores de Ciudad Real, sabendo dos acontecimentos em Vila Rica, abandonaram e cidade. Quando os bandeirantes desceram o Rio Ivaí, passando por Itambé até o Rio Paraná, depois subiram pelo Rio Piquiri e chegaram a Ciudade Real, já não encontraram ninguém. Desta forma, toda a Província del Guayrá ficou sob o domínio dos bandeirantes paulistas, estes destruíram as duas cidades e não colonizaram a Província. O Vale do Ivaí permaneceu, por quase dois séculos, como um vale de ossos secos.

                           Divisão de terras de acordo com o Tratado de Madri
                               http://amazoniaenossaselva.com.br/Pal2.asp?Cod=5&Sld=18     
                                                     (Site pesquisado em 2011)

                   Depois destes acontecimentos, em 1750, as duas nações ibéricas reuniram-se novamente para dividir as terras da América do Sul. O Tratado de Madri, baseado no princípio de uti-prosseditis, davam a Portugal, oficialmente, a posse das terras onde hoje se encontra o Brasil, menos o Estado do Acre, partes do Mato Grosso do Sul e do Amapá, Rondônia e Roraima, que seriam incorporados anos mais tarde. O restante ficou com a Espanha. Findava-se assim, o domínio espanhol nas terras brasileiras. Em 1829, o Guayrá foi incorporado à Província de São Paulo, sendo nomeado como Comarca de Curitiba.

               Mapa da Província de São Paulo, com o território do Guairá incluso, 1850
                                                    (Site pesquisado em 22/3/2013)

                                   

                           NOVAS CORRENTES COLONIZADORAS

            Após a assinatura do Tratado de Madri, várias expedições militares de conquista cruzaram a antiga Província del Guayrá, passando pelos Rios Tibagi, Ivaí, Piquiri e Iguaçu, até o Rio Paraná, a mando do Capitão-general e governador da Capitania de São Paulo, Dom Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, a organização das mesmas ficou por conta de Afonso Botelho de Sampaio e Souza. Os expedicionários chamaram o vale descampado entre os Rios Piquiri e Ivaí de Campos de Mourão, em homenagem a D. Luís, o que posteriormente deu origem ao nome do Município de Campo Mourão.
           Ao todo onze expedições cruzaram o território onde atualmente é o Paraná, entre os anos de 1768 e 1774. Duas expedições, em especial, provavelmente, cruzaram as terras ou as águas de onde hoje é Itambé. A primeira foi de Francisco Lopes da Silva e Estevam Rua Baião, em 1769, que partiram do porto de São Bento, no Rio Tibagi, seguiram pela mata até encontrar o Rio Ivaí e, pelo rio, desceram até as Sete Quedas, no Rio Paraná.
         Na ocasião, relataram suas descobertas sobre as ruínas de Vila Rica ao Tte. Cel. Afonso Botelho que as repassou ao Capitão General D. Luís Antônio. Esse relato foi publicado nos ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, VOL. 76, 1956, disponível na Internet.




                   Mapa da Província de São Paulo, com o território do Guairá incluso, 1850
                   (Site pesquisado em 22/3/2013)

                                   

                           NOVAS CORRENTES COLONIZADORAS

            Após a assinatura do Tratado de Madri, várias expedições militares de conquista cruzaram a antiga Província del Guayrá, passando pelos Rios Tibagi, Ivaí, Piquiri e Iguaçu, até o Rio Paraná, a mando do Capitão-general e governador da Capitania de São Paulo, Dom Luís Antônio de Souza Botelho Mourão, a organização das mesmas ficou por conta de Afonso Botelho de Sampaio e Souza. Os expedicionários chamaram o vale descampado entre os Rios Piquiri e Ivaí de Campos de Mourão, em homenagem a D. Luís, o que posteriormente deu origem ao nome do Município de Campo Mourão.
           Ao todo onze expedições cruzaram o território onde atualmente é o Paraná, entre os anos de 1768 e 1774. Duas expedições, em especial, provavelmente, cruzaram as terras ou as águas de onde hoje é Itambé. A primeira foi de Francisco Lopes da Silva e Estevam Rua Baião, em 1769, que partiram do porto de São Bento, no Rio Tibagi, seguiram pela mata até encontrar o Rio Ivaí e, pelo rio, desceram até as Sete Quedas, no Rio Paraná.
         Na ocasião, relataram suas descobertas sobre as ruínas de Vila Rica ao Tte. Cel. Afonso Botelho que as repassou ao Capitão General D. Luís Antônio. Esse relato foi publicado nos ANAIS DA BIBLIOTECA NACIONAL, VOL. 76, 1956, disponível na Internet.



           Páginas 9 e 10
           Site pesquisado em 9/4/2014

            Através da citação, percebe-se que os vestígios dos espanhóis de Vila Rica não se concentravam apenas na região do atual Município de Fênix, mas foram encontrados a vários quilômetros à Oeste da vila. Sendo assim, é possível crer que os espanhóis também exploraram as terras onde hoje estão os municípios de Itambé e Quinta do Sol. Pois, como já fora mencionado anteriormente, havia limoeiros no Bairro Catarinense antes da chegada dos colonos no século XX. Além disso, o acesso à água era essencial para boas colheitas, então provavelmente todos os colonos preferiam ter propriedades às margens do rio. Sendo assim, haveria cultivo nas duas margens do Ivaí, tanto onde atualmente é Quinta do Sol, quanto em Itambé.

                  Foz do Rio Morão no Rio Ivaí, em frente à Fazenda Ouro Verde

                           Foto: Denizia Moresqui

           A segunda expedição foi de Francisco Nunes Pereira que, ainda em 1769, percorreu o mesmo caminho da expedição anterior, seguiu pelo Rio Ivaí, encontrou as ruínas de Vila Rica do Espírito Santo, descendo pelo Ivaí, chegou ao Rio Paraná e ao Piquiri. Em seguida voltou ao Rio Paraná e seguiu pelo Tietê até São Paulo.
            A segunda fase de colonização do território a Leste do Rio Paraná iniciou-se em1829, com famílias de alemães que se fixaram na Lapa e em Rio Negro.  Em 1847, mais europeus chegam ao Paraná: franceses, suíços, ingleses, italianos e alemães fundam várias colônias no litoral. Em 28 de agosto de 1853, o Paraná deixa de ser comarca de São Paulo e torna-se província, pela Lei 704, tendo como capital Curitiba, em troca do apoio a São Paulo na Revolução Farroupilha. O novo estado ganhou o nome do seu maior rio, Paraná, esta palavara vem do idioma Guarani e significa: PARA, “mar” e NÃ, “semelhante”. Pois os índios consideravam o Rio Paraná semelhante ao mar devido à distância entre suas margens.

                             Mapa da Província do Paraná, 1866

                (Site  pesquisado em 22/32013)

            Por volta de 1855, J. H. Elliot, engenheiro naval americano, veio ao Paraná, a pedido do Imperador Don Pedro II, para estudar a navegabilidade do Rio Ivaí.  Prevendo que o Brasil entraria em guerra com o Paraguai, o Imperador queria saber que rios poderia usar para o transporte de soldados, já que aqui não havia estradas. Então Elliot desceu o rio a partir do local onde hoje se encontra o Município de Cândido de Abreu. Constatou que o Ivaí era navegável de Fênix até o Rio Paraná.
                                Batalha Naval do Riachuelo – Vitor Meirelles. Rio Paraná 11/06/1865
                                Fonte: Google Imagens

            O Norte do Paraná começa a ser colonizado por paulistas e mineiros em 1860, com o plantio de café, feito por mão-de-obra nacional. No Sudoeste, imigrantes italianos, poloneses e ucranianos fundam 34 colônias. Como estas terras estavam sendo rapidamente habitadas, era preciso fazer mapeamentos dos rios da região. Para isso, por volta de 1865, dois irmãos alemães vieram ao estado: Franz e Ferdinand Keller. Esses engenheiros aportaram no Brasil a fim de trabalhar na construção da Ferrovia Madeira-Mamoré, no Norte do país. Não foi por coincidência que um dos rios que corta o município de Itambé foi denominado Keller. Segundo o Prof. Dr. Lúcio Tadeu Mota, da Universidade Estadual de Maringá, os topógrafos da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná batizaram o rio que corta Itambé com o nome de Keller em homenagem aos irmãos alemães, quando mapearam a região para o loteamento da área.

                                Rio Keller
                                Foto: Denizia Moresqui

            Franz, que era também fotógrafo e desenhista, fez uma gravura que retrata a caça de uma anta no Rio Ivaí, imagem que presenciou durante sua viagem ao Norte do Paraná. Como nota-se na citação abaixo, ele considerava a prosperidade dos colonos mais importante que a sobrevivência dos índios.
                                Caça a Anta no Rio Ivaí - Franz Keller – 1865
                                Fonte: Google Imagens
"Não será a prosperidade da família de um colono dedicado ao trabalho duro, buscando com o suor do rosto, criar um novo lar para seus filhos e seus netos, mais importante que o bem estar de um bando de selvagens, com a qual aquela prosperidade poderia interferir?."
(Franz Keller ; engenheiro alemão que realizou levantamentos para a colonização do Paraná por imigrantes europeus em terras onde já viviam índios, 1874)
Franz Keller – Fonte: http://8g5arteband2010.blogspot.com/
(site pesquisado em 2011)

                          Mapa do Rio Ivaí e Tibagi feito pelos irmãos Keller. Fonte: Mota, 2009, p. 185
        Abaixo segue o relatório que os irmãos Keller apresentaram ao Governo do Paraná sobre sua expedição ao Rio Ivaí em 1865. Este relatório serviu de referência para o projeto governamental de estender a Estrada de Ferro Graciosa até o Rio Ivaí, a fim de escoar a safra de grãos do Mato Grosso e do Paraná pelos rios Ivinhema, Paraná e Ivaí até o Porto de Paranaguá. O Porto da hidrovia e o fim da linha férrea seriam feitos nas ruínas de Vila Rica do Espírito Santo, atual Município de Fênix. Destaca-se ainda no texto a intensão de destruir o Salto da Bananeira, no Município de Floresta, para facilitar a navegação de barcos a vapor.



                                Mapa Geral da Província do Paraná com os Caminhos
                                De Ferro estudados e projetado, 1876
                                Fonte: Google Imagens
                     
                         COLÔNIA THEREZA CHRISTINA

           As margens do Ivaí voltariam a ser habitadas por europeus no século XIX, na utópica Colônia Thereza Christina, foz do Rio Ivaizinho, atualmente Município de Cândido de Abreu. Em 1846, o médico e filósofo francês Jean-Maurice Fraive embarcou no navio Fides, na Bélgica, rumo ao Brasil, levando consigo 63 franceses e o sonho de criar aqui uma sociedade justa e igualitária, sem nenhum tipo escravidão. Fraive fora médico assistente de José Bonifácio e da Imperatriz do Brasil, Thereza Christina Maria, esposa de D. Pedro II. O casal real o ajudou Faivre a realizar o sonho de fundar a comunidade. Então, o médico a homenageou a Imperatriz com o nome da colônia. Ele abandonou o trabalho no Rio de Janeiro e as reuniões na Academia Real de Medicina, da qual foi um dos fundadores, para viver às margens do Ivaí.

                               Croqui da Vila Agrícola Thereza Christina
Site pesquisado em 25/2/2014

           A colônia Thereza Christina é considerada como o primeiro modelo de cooperativismo brasileiro. Faivre inspirou-se nos ideais socialistas e cooperativistas de Saint Simon,Charles Fourier e Robert Owen.  Em 1947, os franceses limparam a mata às margens do Ivaí e prepararam a terra para o plantio na margem esquerda do rio, onde hoje é o Município de Prudentópolis. Foram cultivados, café, baunilha, algodão, milho, trigo e cana-de-açúcar. As casas foram construídas na margem direita do Ivaí. Cerca de cem brasileiros também ajudaram nas construções. Para cultivarem a terras, os moradores atravessavam o rio de canoa. Havia regras estabelecidas por Faivre para o uso da terra e a convivência entre os colonos. Mas, após um ano da fundação, muitos abandonaram o local. Mesmo assim, o médico administrou a colônia por onze anos, até sua morte, aos 63 anos, em agosto de 1858. Então, seu sobrinho, o engenheiro Gustavo Rumbelsperger, assumiu a liderança do local, que perdurou por mais dez anos, quando foi abandonada pela maioria dos colonos.
         No ano de 1871, a colônia passou a ser Freguesia com o nome de Therezina e resiste até hoje como uma pequena vila.

       
                                  A GUERRA DO CONTESTADO

         Outro episódio que transformou a história do Paraná foi a Guerra do Contestado. Esta ocorreu porque o governo imperial, em 1889, concedeu para a Estrada de Ferro São Paulo - Rio Grande, uma subsidiária da Brasilian Railways Company, grande áreas de terras devolutas, assim denominadas por terem sido devolvidas a Portugal pela Espanha.  A ferrovia ligaria as Províncias de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. As terras paranaenses concedidas à companhia correspondiam ao Sudoeste, Oeste e Norte do Paraná. Além de quinze quilômetros de cada lado por onde a ferrovia passasse. Porém estas áreas já eram habitadas por colonos, mas tiveram suas terras tomadas pela companhia ferroviária com aval do governo paranaense e brasileiro. Então os colonos ficaram sem trabalho. Além disso, pessoas ligadas à companhia ferroviária adquiriram uma grande área de terras para a exploração madeireira e mais colonos foram expulsos. Para piorar, ao término da construção da estrada de ferro, muitos trabalhadores que atuaram nesta obra e vieram de outras regiões do país, ficaram desempregados e sem qualquer ajuda da companhia para voltarem aos seus lares.

                                Estrada de Ferro São Paulo – Porto Alegre
                                Fonte: Google Imagens

            Neste cenário surge o fanatismo religioso alimentado pelo beato José Maria. Ele atuava na área do Contestado, assim denominada porque os agricultores contestaram a doação de suas terras às madeireiras e à Southern Brazil Lumber & Colonization Company. Além disso, esta região também era disputada pelos estados do Paraná e Santa Catarina.
            José Maria pregava a criação de um mundo novo, cheio de paz e prosperidade, com terras para plantar, conduzido pelas leis de Deus. O beato reuniu milhares de seguidores principalmente entre os colonos sem terras. Preocupados com a influência de José Maria sobre os insatisfeitos, os coronéis da região e o governo passaram a perseguí-lo, enviando o exército para combater o beato e seus seguidores. Nas batalhas, entre 5 ou 8 mil camponeses morreram. A guerra terminou em 1916, com a prisão de Adeodato, um dos chefes dos rebeldes. A lei dos fortes venceu a utopia dos fracos. Além disso, o Paraná perdeu o território do Contestado para Santa Catarina.

                          Guerra do Contestado, em rosa, território que o Paraná

                                    perdeu para Santa Catarina
                                    Fonte: Google Imagens

















4 comentários:

O circo no Moreschi

 Bairro Moreschi (Fazenda Anjo da Guarda), local onde, possivelmente, o circo fora montado                                           ...