terça-feira, 24 de janeiro de 2017

HISTÓRIA DE ITAMBÉ - PARTE 3




A fundação de Itambé

Itambé – Distrito de Marialva
João Cortez Capel
O nome do Distrito
O menino que viu Itambé nascer
Desmatamento
Área Urbana
Cultivo de hortelã menta
O café
Criação de animais
Sindicato dos Trabalhadores Rurais


                             ITAMBÉ – DISTRITO DE MARIALVA
           O território onde hoje é Itambé, até o início da década de 40, pertencia a Londrina, município que se estendia até o Rio Paraná, tendo aproximadamente 22.400 km2.
      Nesta época, havia apenas 49 municípios no Estado.  Já em 1943, grande parte das terras passaram a pertencer à Apucarana, que herdou de Londrina 18.658 km2, tudo coberto de Mata Atlântica.
   Em 1947, quando começou a ser colonizado, Itambé pertencia a Mandaguari, que se estendia por 14.000 km2 e três distritos: Marialva, Maringá e Paranavaí. Em 1951, os três distritos foram emancipados. Marialva, com 21.369 habitantes, tornou-se município com dois distritos: Marialva e Itambé, em 1954, foi criado mais um, Sarandi.

Município de Mandaguari, 1947.
(site pesquisado em 2012)

          Toda a colonização do Norte do Paraná começava com a demarcação das terras. Para tanto, havia o trabalho do agrimensor. De acordo com a Wikipédia, agri vem de agrícola e mensor de se refere à medida. Sendo assim, o agrimensor tem o papel de medir e dividir propriedades nas áreas rurais e urbanas. Esta função surgiu no antigo Egito. Como o Rio Nilo transbordava todos os anos apagando as marcas físicas de divisões de propriedades, o Faraó resolveu o problema nomeando um profissional para medir e dividir as terras novamente: o agrimensor.
           Para ilustrar como era a vida dos agrimensores, recorreu-se ao depoimento da viúva de um destes profissionais, Dona Rosalina Maria Aparecida da Silva, mais conhecida como D. Rosa Bandeira. Ela veio para cá em 1943 acompanhada de seu esposo, um agrimensor contratado pelo Governo do Estado, o Sr. Francisco da Silva, popular Sr. Bandeira. Ele mensurava as terras da margem esquerda do Ivaí, hoje Quinta do Sol, que pertenciam ao Estado. Dona Rosa afirma que em Itambé só havia uma picada por onde passavam com muita dificuldade.
Dona Rosa e o carro com que desbravavam o sertão
Fonte: Família Bandeira

            Ela lembra que eles vinham de Japurá e chegavam até o Ivaí de carro por picadas abertas na mata, era preciso desviar dos troncos, atravessavam o rio na Balsa Ilda, também subiam por ele de bote a motor. Era necessário levar pouca bagagem, alimentos só até dez quilos. A gleba a ser mensurada era localizada por mapas e por indicação de pilotos de avião que sobrevoavam o local.
           Para abrigar-se durante o trabalho, o agrimensor e sua equipe faziam barracas de lona, cercadas com folhas de palmito, a cama era um lençol no chão, não havia nenhum conforto. A equipe mudava-se a cada oito dias para medir e fazer picadas em outras terras. Media-se primeiro todo o entorno da gleba, que podia chegar a dois mil alqueires, depois esta era subdividida em pequenos lotes e os picadeiros, homens que ajudavam no trabalho, abriam caminhos para se chegar a cada lote, chamados de picadas. O desmatamento da área ficava por conta de quem adquirisse as terras. Geralmente as madeiras mais nobres eram vendidas e o restante da mata era aniquilado pelo fogo. Assim fazia-se a “limpeza” da área para o cultivo da terra.

Barracas montadas pelo agrimensor e sua equipe

Fonte: Família Bandeira
             
         De acordo com Dona Rosa, havia dificuldade em vender os lotes porque ninguém queria terras devido à malária. Ela afirma ter contraído várias vezes a doença. Então os lotes eram vendidos a famílias que já estavam vivendo na região.
         Outro problema encontrado por Dona Rosa eram os animais que invadiam o acampamento. Diariamente, quando ela ia lavar os pratos no rio, porcos do mato cercavam as barracas à procura de alimento. Só iam embora quando ela fazia muito barulho. Havia também onças, jacarés e veados.

Veado nadando no Rio Ivaí em 1951
Acesso: 29/03/2015

         Tempos depois da abertura das terras de Quinta do Sol, a Família Bandeira resolveu estabelecer-se à margem esquerda do Ivaí, adquirindo um lote de terras do Governo do Estado, mas possuía uma casa em Itambé, onde os filhos moravam para estudar. Então, para atravessar o rio, eles construíram uma pequena balsa com tambores de óleo diesel e tábuas, que era puxada por cordas. Depois foi feita uma balsa maior movida a motor. 

Primeira Balsa – Fonte: Família Bandeira

Segunda Balsa da Família Bandeira
Fonte: Família Bandeira

          O condutor da balsa, entre 1975 e 1980, foi o pernambucano Sr. Celestino Barbosa da Silva, que vive às margens do Ivaí desde 1963. O rio era atravessado por tratores, carros, máquinas agrícolas, caminhões, com destino à Quinta do Sol, Barbosa Ferraz ou Campo Mourão. Segundo Celestino, a balsa tinha a capacidade de levar doze carros de uma só vez ou oito caminhões carregados. A travessia durava cerca de quatro minutos. Mas um dia, furou o batelão da balsa, choveu um dia e uma noite, encheu de água e não foi possível retirá-la. Um trator foi usado para rebocá-la, sem sucesso. Então a água do rio foi subindo, os cabos de aço que prendiam a balsa romperam e ela afundou.
Senhor Celestino, o balseiro
(site pesquisado em 2012)


                    Um dos agrimensores que ajudaram a demarcar as terras de Itambé foi o Senhor José Bianchessi, catarinense de Botuverá. Por desentendimentos com a família, José mudou-se para Norte do Paraná, onde começou a trabalhar como picadeiro na Companhia Melhoramentos, até tornar-se agrimensor leigo. No final da década de 40, ele conseguiu emprego para o primo Oswaldo Bianchessi na mesma Companhia. Este, por dois anos, fez picadas para demarcar os lotes e também cozinhou para os outros picadeiros. Além de prestar serviços em Itambé, Oswaldo trabalhou em São João do Caiuá, Santo Antônio do Caiuá e Paiçandu.
         Estudos realizados pela Professora Elizabete Aparecida Moreno mostram que a Companhia Melhoramentos Norte do Paraná começou a demarcar e lotear a região de Itambé por volta de 1944.

Agrimensores e picadeiros que trabalharam em Itambé

Fonte: Família Bianchessi



           

                                         JOÃO CORTEZ CAPPEL

          O responsável pela colonização de Itambé foi o Senhor João Cortez Capel, corretor de imóveis da Cia. Melhoramentos Norte do Paraná. De acordo com a REVISTA CAFÉ, de 16 de maio de 1951, Londrina, Cortez nasceu na província de Almeria, Espanha, a 4 de fevereiro de 1905; filho de Indalécio Cortez Felices e Ana Cappel Sanchez. Aos doze anos de idade já começou a trabalhar num armazém em sua cidade natal. Aos treze, empregou-se juntamente com seu pai numa empresa de extração de minérios, onde conseguiram juntar algumas economias.
João Cortez Capel, fundador de Itambé
Fonte: Fabrícia Cortez

        Em 1917, eles tomam conhecimento que uma firma de Gibraltar, na Península Ibérica, estava enviando emigrantes para o Brasil. Pai e filho foram até àquela cidade, mas chegando lá receberam a notícia que, devido à Primeira Guerra Mundial, o tráfego marítimo estava suspenso. Então eles decidiram trabalhar naquela cidade mesmo. Em 1919, terminada a guerra, a navegação se normalizou e, enfim, a família veio para o Brasil abordo do velho navio francês Aquitanie. A viagem durou 43 dias; o desembarque se deu no dia 14 de outubro. A princípio, instalaram-se na Casa dos Imigrantes em São Paulo, capital. Depois seguiram para a Fazenda Capuava, em Guariba, no mesmo Estado, trabalhar no cultivo de café. Lá, João Cortez Cappel ouviu as histórias dos bandeirantes que desbravaram os sertões do Paraná e começou a sonhar em ser também um desbravador.
        A família Cortez trabalhou por dezoito anos em diversas fazendas até que conseguiu adquirir um sítio de 20 alqueires em Cafelândia, São Paulo. Porém, as intempéries climáticas e as formigas prejudicavam a produtividade. Então João percebeu que havia muita argila no sítio, fez um empréstimo de 10 contos de réis com o Dr. Gilberto Figueira e montou uma modesta olaria na propriedade. Formou um estoque de 180.000 unidades de tijolos, mas quando foi vender o produto, ele descobriu que o milheiro só valia 50 mil réis.
      Depois, João partiu para a atividade veterinária, como castrador de animais, tornando-se assistente do perito Eduardo Martins. Em pouco tempo, tornou-se melhor profissional que o mestre e sua fama espalhou-se por uma vasta zona do Estado de São Paulo. Todos os pecuaristas solicitavam seu trabalho, a prosperidade começou aqui.
     Mas João ainda se lembrava do sonho de ser desbravador. Em 1936, espalhou-se a notícia de uma obra gigantesca: a colonização do Norte do Paraná. Cortez, decidido a dar uma vida melhor para os pais, segue para o Paraná em março do mesmo ano. Chegou a Cornélio Procópio com 16 réis e hospedou-se no Hotel do Norte. Saiu à procura de emprego e, por intermédio do Sr. Manoel Calvo, conseguiu trabalho de castrador na Fazenda do Coronel Bresser. O segundo trabalho, também por intermédio de Calvo, foi na Fazenda Matarazzo, a 24 quilômetros de Cornélio Procópio. E, assim, de fazenda em fazenda, Cortez permaneceu por três meses. Em seguida, voltou a Cafelândia, vendeu o sítio e a olaria.  Como estava viúvo, casou-se com Jeruza Gomes no dia 31 de dezembro de 1936. Retornou oito dias depois a Cornélio Procópio e, com os quatro contos de réis da venda das propriedades, ergueu uma casa modesta num rancho. Abandonou a profissão de castrador e ingressou na Companhia de Terras Norte do Paraná, como corretor, no cargo de subgerente. Meses depois, em substituição ao agente João Schiavina, tornou-se agente autorizado da Companhia.

Cappel com seus pais: Indalécio Cortez Felices e Ana Cappel Sanchez
Fonte: Fabrícia Cortez

        Mesmo em um alto cargo, os resultados financeiros eram modestos devido à falta de propaganda sobre as terras. Então Cortez tornou-se também mascate para ampliar sua receita. Além disso, trabalhou novamente como castrador e fotógrafo, uma das antigas profissões de seu pai. Quando a Cia. passou a investir em propaganda, as vendas de terras aumentaram, pois agricultores de todo o país vinham adquirir lotes no Norte do Paraná. Assim foi possível a Cortez abandonar suas outras profissões e dedicar-se apenas à corretagem de terras. Com o sucesso de seu trabalho, a Cia. nomeou-o vendedor exclusivo dos lotes de Cornélio Procópio e Bandeirantes. Em 1941, o corretor mudou-se com a família para Cambé, onde construiu uma casa. Porém, por ordem da Cia., precisou voltar para Cornélio Procópio, a fim de ficar mais próximo do local de suas vendas. Já em 1944, passou a residir em Londrina. 
João Cortez Cappel no seu escritório em Londrina
Fonte: Fabrícia Cortez

         João Cortez Cappel também se dedicou a agricultura, adquiriu doze alqueires em Mandaguari para cultivar café. Mas, devido à distância das terras em relação à Londrina, vendeu-as e adquiriu outros lotes em Astorga. Com o trabalho de corretor e cafeicultor, ele enriqueceu. Cortez negociou terras em várias partes do Norte paranaense.
        Ele próprio relatou à Revista Café que estava difícil vender lotes da Gleba Ijuí, atual Município de Itambé, mesorregião do  Norte Central Paranaense, pois a região ficava longe de qualquer cidade ou distrito que abastecesse os agricultores. Então, tomou uma importante decisão: construir uma cidade com seu dinheiro. Como se pode ver na citação abaixo:
Localização de Itambé no mapa do Paraná
Fonte: Google Imagens

        “Quando a Companhia Norte do Paraná resolveu abrir a zona de Itambé, loteando-a para venda, João Cappel notou certo retraimento de parte dos prováveis compradores. Procurando inteirar-se das causas de tal atitude, teve a solução, e compreendeu perfeitamente o que havia a fazer.
         A longa distância da gleba a mais próxima condução ou posto de abastecimento dificultava sobremaneira a colonização da mesma.
         Não teve outra idéia o dinâmico Cortez Cappel, imediatamente traduzia em grave compromisso: se a Companhia não fundasse nessas terras um patrimônio-sede, com os estabelecimentos comerciais necessários à vida de seus habitantes, ele, João Cortez Cappel, comprometia-se a fazê-lo, à sua própria custa.
         Nada conseguindo da Companhia, cumpriu a promessa: montou bem aparelhada serraria, bastante para construções no patrimônio como aos sítios vizinhos; construiu o Grupo Escolar e uma boa Igreja; estabelecimentos comerciais para alugar e alguns abastecidos por si próprios; presentemente iniciadas foram as construções da Cadeia Pública, da estação Rodoviária e muragem do cemitério, tudo por conta do seu bolso.”

(Fonte: Revista do Café e Açúcar, Maio Junho de 1951, pág. 104)

Propaganda de lotes de Itambé
Fonte: Revista do Café e Açúcar, Maio Junho, 1951, pág. 40


             Então, em 1951, Cortez comprou um lote na Gleba, onde fica hoje a cidade de Itambé. Fez um mapa urbano, dividindo a área em ruas, quadras, terrenos e praças. Registrou o mapa em Curitiba e começou a vender estes terrenos às famílias que migravam para cá. Sendo assim, todas as primeiras escrituras destes terrenos estavam em nome de João Cortez Cappel. Até hoje, há lotes que ainda não foram transferidos e estão em seu nome. 

Mapa de Itambé registado por Capel.
Fonte: Elizabete Aparecida Moreno

            É interessante verificar que o mapa de Cortez possuía o mesmo traçado que a cidade de Itambé tem até hoje. Isto mostra que a organização proposta pelo agrimensor foi respeitada, com poucas ressalvas, como o local onde está a Igreja Matriz Nossa Senhora das Graças. De acordo com o mapa de Cortez, ela deveria ter sido construída bem no centro da Praça Rui Barbosa e, onde a Igreja está hoje, seria uma rua. Além disso, os conjuntos habitacionais não estavam previstos no mapa. O Sr. Jovânio Pereira dos Santos conta que até os nomes das ruas foram escolhidos por ele. Quando a pioneira Pelarga Buchinski Schischoff chegou a Itambé, em 1947, a Avenida São João se chamava Avenida João Cortez. A Rua São Pedro leva o nome do filho mais velho de João, Pedro, assim como a Rua Santo Indalécio leva o nome de outro filho e também do pai de João, Indalécio. A antiga Rua Santana, hoje Rua Dr. Lafayette Grenier, levava o nome da filha de João Cortez, Ana; já a Rua dos Expedicionários é uma homenagem aos expedicionários na 2ª Guerra Mundial. A Rua das Loudes, hoje Rua Antônio Belaski Garcia, foi em honra à sua outra filha. Com o passar do tempo, alguns nomes de ruas foram mudados, mas outros permaneceram.

Jesusa, esposa de Cortez, e seus filhos que nomearam as ruas de Itambé:
Lourdes, Ana, Indalécio e Pedro.
Fonte: Fabrícia Lopes Cortez de Abreu

        Assim nasceu Itambé, da firme determinação de um homem, que investiu seu próprio dinheiro e energia para ajudar a construir novos sonhos. Segundo o pioneiro Antônio R. Machado, a seriedade e honestidade de Cortez estimularam os agricultores a adquirirem lotes em Itambé.
        Cortez oferecia os lotes daqui a moradores de Londrina, Uraí, Bandeirantes, Cornélio Procópio, que adquiriam sítios e se mudavam para cá. Inicialmente foi sendo habitada a zona rural da localidade.
       Os primeiros lotes foram comprados em 1946. Massakasso Honda adquiriu vários e os distribuiu para seus filhos. Ovídio Pinto Mello, que também adquirira um lote em 46, na Estrada Gabirobeira, vendeu seus direitos a Luiz Dela Colleta. Outros compradores foram: Gaudêncio Severo Luís e Mário Machado, este na região do Guerra. Joaquim Rogério (Menino) comprou um lote que denominou Fazenda São Paulo, ele morava em Cornélio Procópio, mas mudou-se para cá, começou a desmatar o lote e a criar suínos. José Santana, de Bandeirantes, comprou terras na nascente da Moóca. Platão Herotides da Veiga e seus irmãos Chinofonte e Sócrates também adquiram sítios na região da Água da Moóca.

Recibo da primeira parcela de pagamento das terras de Ovídio Pinto Mello,
posteriormente vendidas a Luiz Dela Colleta. Fonte: Família Dela Colleta

             João Cortez Cappel, após vender a maioria dos lotes e terrenos, nomeou seu filho Pedro para continuar seu trabalho e foi para a região onde hoje se encontra Francisco Alves abrir aquele município. Cortez faleceu a 13 de maio de 1984 de parada cárdio respiratória, insuficiência cardíaca e diabetes mellitus, aos 79 anos de idade, em Francisco Alves/PR.
             Anos mais tarde, em 1963, na gestão do Prefeito João Antônio Claro, surgiu a Vila Persona, que foi desmembrada do lote 44, pelo Senhor Simão Persona com autorização da Prefeitura Municipal. Todo o loteamento da Vila era composto por 61 lotes, isto é, não contando com a reserva onde hoje está a Praça Massakasso Honda. A área ficava entre as Ruas Luís Lopes, dando continuidade da Rua Santana, hoje Rua Dr. Lafayete Grenier, as laterais, Rua Santo Indalécio até no fim da Rua Paraíba, saída para Akidabam, e a continuação da Avenida São João até o local onde hoje está instalado o Hospital Municipal. Os cruzamentos que faziam parte do lote eram das ruas Clarindo R. Santana, Elizabete Bróio e Rua Rômulo Bessani, que anteriormente eram denominadas apenas com números.

                                   O NOME DO PATRIMÔNIO

Estrada Keller, primeiro caminho para Itambé
Fonte: Revista Itambé, 1984

         Todo nome tem uma história. Já o nome de Itambé possuiu várias histórias. Inicialmente, o patrimônio foi conhecido como Vila do João Cortez. Uma das teorias para o nome “Itambé” é a seguinte: o pioneiro Antônio Rodrigues Machado conta que a única via que dava acesso ao Distrito de Itambé era a Estrada Keller, que liga Itambé à Cambuí. Nesta estrada há muitos morros, daí poderia ter surgido o nome do patrimônio. Pois segundo o Plano Diretor, Itambé é de origem tupi e significa: “i’ta” pedra e “aim’bé” afiada, penedo, pontiagudo. Alguns autores ainda classificam como “beiço de pedra”, por J. F. da Fonseca, ou Xavier Fernandes, “pedra oca”, ou ainda “despenhadeiro, precipício”, segundo Aurélio Buarque de Holanda.
      Outra teoria é que o nome teria sido sugerido por um picadeiro sertanejo que vivia em Itambé, na Bahia. Segundo relatos da Prof. Elisabete Aparecida Moreno, este baiano achou que a geografia daqui se assemelhava a de seu município natal. Isto teria acontecido logo que a Companhia Melhoramentos Norte do Paraná abriu a Estrada Keller, em meados da década de 40.
       Mas, segundo Oswaldo Bianchessi, que trabalhou como picadeiro na abertura destas terras, o nome foi motivado pela grande quantidade de cipó imbé e pelos artefatos indígenas aqui encontrados.

Cipós, Mata do Nicola
Foto: Denizia Moresqui

                          O MENINO QUE VIU ITAMBÉ NASCER
Antônio Rodrigues Machado, o menino que viu Itambé nascer, aos 77 anos
Foto: Denizia Moresqui

         A primeira família que se cultivou terras aqui, Machado, veio de Cornélio Procópio. Mário Machado e seu filho Antônio, então com 12 anos, instalaram-se em Cambuí, na fazenda São Pedro, numa casa feita de palmitos e coberta com tabuinhas, na cabeceira do Ribeirão Ijuí.

Exemplo de casa feita de lascas de palmito e coberta com tabuinhas, Maringá

Fonte:http://maringaparanabrasil.blogspot.com.br/2012/06/memoria-as-cores-do-norte-do-parana.html

         Eles compraram cinco alqueires diretamente da Cia. Melhoramentos e pagaram um conto de réis e trezentos o alqueire. Os Machado vinham a pé até Itambé para abrir seu lote. A primeira vez que Antônio veio ao Patrimônio, encontrou os funcionários da Cia. Melhoramentos abrindo uma rua no meio da mata, que seria a Avenida São João. Os picadeiros estavam alojados próximos a uma nascente denominada Água Ipacaraí, hoje conhecida como Água da Serraria. Os Machado foram até lá matar a sede. O menino ficou encantado com a beleza do lugar, cheio de samambaias. Ele ainda descreveu as nossas matas, dizendo que a beleza que encontrou aqui nunca vira em lugar nenhum.

Nascente de água que encantou o menino Toninho

Foto: Denizia Moresqui

           A picada aberta pela Cia. só chegava até a Gabirobeira, depois havia apenas matas. Para abrir suas terras, pai e filho utilizavam ferramentas rudimentares, como traçador, cavadeira, machado e foice. A espingarda também era essencial para a sobrevivência, já que havia onças e outros animais perigosos na região. Finalmente após aberta a mata, no dia 16 de outubro de 1947, os Machado se mudaram para o local que depois seria conhecido como Guerra. As primeiras terras abertas em Itambé foram estas e as do Perobal.

                                          O DESMATAMENTO

              Segundo a Monografia da Prof.ª  Lúcia de Melo (1997), apresentada ao curso de Geografia da Universidade Estadual de Maringá, Itambé possui condições ideais para a formação de florestas exuberantes, pois além do solo fértil, conta com clima mesotérmico úmido, variando de 15 a 25ºC. Assim desenvolveu-se aqui a vegetação Mata Pluvial Tropical dos Planaltos do Interior, com árvores de grande porte.
               Mas, se hoje uma das principais preocupações da humanidade é preservar a natureza, tanto flora quanto fauna, na abertura das terras do Norte do Paraná, a meta era o oposto. Para cultivar a terra era preciso abrir espaço na mata e expulsar ou eliminar animais que trouxessem riscos aos colonos. Além disso, nos primeiros anos, sem produção e renda, a caça e a pesca eram formas de subsistência.
Agricultores com a caça: um veado, 1948
Fonte: Gertrude Granero

              Então entraram em cena foices, machados, traçadores, fogo, e a floresta foi trocada pela terra nua onde seria cultivado o futuro de muitas famílias. Naquela época, não havia ainda a consciência ecológica que poderia permitir o desenvolvimento sustentável. O momento histórico e a necessidade tornavam o desmatamento desta região imprescindível ao progresso. Foram abaixo perobas, cedros, imbuias, canelas. Com o fim da mata, os animais foram caçados, mortos pelos incêndios ou fugiram, entre eles havia: onças, cotias, pacas, anta, tatu, jaguatirica, macaco, porcos do mato, veados, jacupembas, tamamduás, quase todos foram se desaparecendo da região.

              Desmatamento de Itambé – 1950. Fonte: Prefeitura Municipal de Itambé


       Segundo o Sr. Celestino Barbosa da Silva, que trabalhou como picadeiro em Itambé e Quinta do Sol, para descendentes de japoneses que cultivavam hortelã menta, o desmatamento era feito da seguinte forma: o mato baixo era roçado com machado e foice, depois derrubavam-se as árvores grandes também com machado. Eram necessários oito dias para “limpar” um alqueire. As madeiras nobres eram levadas às serrarias e o resto virava lenha usada nos alambiques de hortelã. O tamanho e a circunferência das árvores eram impressionantes, devido à fertilidade da terra.
Família Vertuan em frente a uma árvore no Couro do Boi
Fonte: Renata Vertuan

       Outro pioneiro que também fixou moradia no Guerra foi o Sr. Aluízio Linhares Monteiro. Sua filha Sônia L. M. Chicralla conta que o pai soube das terras de Itambé por intermédio de seu irmão que era viajante, vendia fumo para todo o sul do país. Na época o Sr. Aluízio, fluminense de Sapucaia, estava morando em Miraí, Minas Gerais. Ele viajou ao Rio de Janeiro de carro, depois de avião para Londrina. Até Itambé, o caminho foi percorrido de caminhonete 48. Junto com ele veio seu cunhado Aristides Cumani. Depois de comprar terras da Cia., o Sr. Aluízio e sua família começaram a desmatá-las. Eles faziam este trabalho da seguinte forma: cortavam-se as árvores, que chegavam a mais de um metro de diâmetro, com machado, em seguida eram puxadas por cordas e cortadas com traçador, um serrote manuseado por duas pessoas, por fim a madeira era vendida para as serrarias.
Sr. Aluízio Linhares Monteiro na época do desmatamento de Itambé (1950)
 Fonte: Família Linhares Monteiro
        
           O Senhor Olímpio Bianchessi conta que veio a Itambé em 1950 visitar sua irmã que morava no Bairro Catarinense. Quando chegou aqui, ficou encantado com o relevo e a fertilidade da terra. Ele percebeu a grande diferença entre Itambé e Botuverá, lugar onde vivia. O distrito catarinense era montanhoso com poucas áreas cultiváveis, trabalhava-se muito para apenas manter a subsistência; enquanto que, em Itambé, as altas florestas sinalizavam a riqueza da terra, além disso, havia poucas ondulações no solo, o que permitia o cultivo em quase toda a extensão dos lotes. Segundo Olímpio: “um paraíso”. Ele vislumbrou um futuro promissor em Itambé. Como ainda estava com dezenove anos, escreveu uma carta aos pais pedindo permissão para ficar morando aqui. Eles responderam que, se o filho visse que haveria futuro em Itambé, poderia ficar; se não, que voltasse para casa. Então Olímpio ficou e, com o pouco dinheiro que tinha, comprou um machado e alguns utensílios de cozinha. Depois começou a desmatar um alqueire e meio de seu parente Arcênio Bianchessi para plantar três mil pés de café. Ele conta que dependendo da árvore, era preciso um dia e meio de serviço para cortá-la, dada sua espessura. O trabalho começava de madrugada e só parava à noite. Suas mãos ficavam cheias de feridas que eram curadas com salmoura. Após derrubar boa parte da mata, ele tentou limpar o terreno com fogo, mas como ainda havia muito mato e sombra, as chamas se apagavam. O Senhor Arcênio sugeriu que ele deixasse para acabar o serviço no próximo ano. Mas Olímpio não queria esperar tanto. Juntou as toras e cortou o mato com foice e assim conseguiu limpar o terreno e plantar café. Para sua sobrevivência plantou milho e feijão entre as ruas. 
Desmatamento, construção de casas e cultivo de café
na Fazenda Ouro Verde
Fonte: Família Meyer
       
        O Senhor Paulo Bogenschneider e seus cunhados, os irmãos Bindewald, João, Alberto e Henrique, também participaram do desmatamento, transportando a madeira para Mandaguari e outras cidades, onde era vendida. Paulo era natural da Alemanha, chegou ao Brasil em 1921, fixando-se em Presidente Venceslau/SP, no Estado, trabalhou em serrarias, casou-se com Lídia Bindewald em 1928. Em 1947, mudou-se para Mandaguari e, com os cunhados, trabalhou na serraria de Guilherme Meyer, extraindo e transportando as madeiras de Itambé. Aqui, eles receberam um lote do Sr. João Cortez Cappel e construíram uma das primeiras casas do Patrimônio. Os irmãos Bindewald eram da Romênia e imigraram para o Brasil em 1926, também residiram em Presidente Venceslau. Além de madeira, eles levavam pessoas sobre as toras até Mandaguari, pois poucos eram os meios de transportes.
          Como havia muita oferta desta matéria prima, os preços não eram elevados e madeiras nobres do Norte paranaense eram usadas até para fazer engradados de refrigerantes.
          Após o desmatamento, as famílias partiam para o cultivo da terra. Inicialmente eram cultivados hortelã e café. Ambas as culturas eram produto de exportação, com vendas certas e extremamente rentáveis, mas necessitavam de muita mão de obra. Na época não existia a profissão de boia-fria. Quem trabalhava para os proprietários de terras eram os meeiros, pessoas que prestavam serviço na lavoura e recebiam porcentagem da produção. Quanto maior o lucro do proprietário, maior a renda do meeiro. Dessa forma, muitas famílias se mudaram para Itambé, pois, mesmo quem não tivesse capital para comprar as terras da Cia., poderia trabalhar para os outros até juntar dinheiro e poder adquirir seus próprios lotes.
Colônia de meeiros de café na Fazenda Monte Alto
Fonte: Paulo Tadashi Honda


                                             ÁREA URBANA
Avenida São João, década de 50
Fonte: Prefeitura Municipal de Itambé

           Na área urbana, o projeto de Itambé traçado por Cortez Cappel começava a tomar forma com a chegada dos primeiros comerciantes. Quando a Senhora Francisca Cardoso Rosa chegou ao Patrimônio, em 1947, estava com catorze anos, mas já era casada com José Noé da Silva e trouxe seu primeiro filho, com vinte dias, nos braços. Aqui só havia mata, que foi derrubada por Paulo Xavier e picadeiros contratados por Cortez, depois um grande incêndio fez a “limpeza” do local onde seria instalado o Patrimônio. Francisca e José conheceram o Senhor Paulo Tutti, que comprara um terreno, na Avenida São João; hoje há no local uma revendedora de botijões de gás. 

(Seta) Primeira casa e comércio de Itambé:
Venda do Paulo Tutti
Fonte: Prefeitura Municipal de Itambé

        Paulo queria construir uma venda de secos e molhados com uma casa nos fundos; então perguntou a José se ele conhecia algum carpinteiro. José respondeu que ele era carpinteiro. Então Paulo Tutti o contratou para o trabalho: construir a primeira casa de Itambé. O prédio de madeira, que abrigou o primeiro morador e a primeiro comércio do Patrimônio, resistiu até outubro de 2003, quando foi destruído num incêndio. Além deste prédio, José também construiu outras casas, como a que existe até hoje no endereço: Rua São Pedro, nº 340; uma pensão, a venda de João Noé, na Avenida São João esquina com Rua XV de Novembro, onde atualmente há uma sapataria. 

Seta: José Noé da Silva, construtor da primeira casa e comércio de Itambé
Fonte: Francisca Cardoso Rosa

          Infelizmente, um acidente mudou para sempre a vida do casal. José, na época com 38 anos, estava construindo um alambique de hortelã na Fazenda São Sebastião. Então, uma viga de madeira de 30 cm. de diâmetro e 6 m. de comprimento, que era puxada por um trator,  caiu em cima de José quebrando-lhe a coluna. Após muitos meses de tratamento em Maringá e Curitiba, voltou para casa e ficou para sempre na cama, pois não aceitou a cadeira de rodas. Mesmo nesta situação, continuou a trabalhar, construindo brinquedos de madeira e consertando utensílios domésticos. Dez anos após o acidente, José faleceu.
             O Senhor João Naujalis também chegou a Itambé em 1947, com sete anos de idade, acompanhando seu pai, Antônio Naujalis, imigrante da Letônia. Segundo João, havia aqui apenas duas casas de madeira, uma era o armazém do Paulo Tutti e outra era a pensão do Senhor Paulo Xavier, onde ficavam os picadeiros. Havia também casas de palmito e tabuinha, a cidade era composta por seis quadras desmatadas e cercadas pela densa floresta. Nesse ano, família Lopes já administrava a serraria.
Caminhão sendo carregado de toras para a Serraria da Família Lopes
Fonte: João Naujalis

            O senhor Antônio Naujalis adquiriu a pensão de Xavier e passou a receber os pioneiros que vinham a Itambé desmatar suas terras. A família Naujalis administrou o negócio de 1947 até 1953, quando mudou-se daqui por causa de uma geada seguida do incêndio nas lavouras.
                  Em junho de 1948, um estudante de farmácia visitou o distrito de Itambé, o jovem Mauro Nakamura. Ele lembra que encontrou a área urbana já desmatada e com os lotes demarcados.
Moradores de Itambé
Fonte: Mônica Osvaldo do Nascimento

               Aqui, Mauro conheceu o Sr. Antônio Naujalis. Conheceu também a família do Sr. Augusto Fernandes Cumbar, que fazia as refeições para os visitantes, o Sr. Paulo Tutti, o Sr. Paulo Xavier, descendente de africanos, que era empreiteiro e administrava a derrubada das matas, o Sr. Paulo Bogenschneider, que tinha um bar no Patrimônio, o Sr. Luís Lopes, dono da serraria, entre outros. Apesar da geada e das dificuldades que enfrentou nesta primeira visita, Mauro Nakamura gostou muito do lugar. Então, quando recebeu seu diploma de farmacêutico em dezembro de 1948, decidiu vir trabalhar em Itambé. Morou em Marialva até 1950, depois construiu sua casa neste distrito e mudou-se definitivamente para cá.


                                CULTIVO DE HORTELÃ MENTA
Agricultores cultivando hortelã menta
Fazenda Jan
Fonte: Ademar Adão Rodrigues

               Apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelos moradores, Itambé crescia devido à fertilidade da terra e a cultura do café. Também eram cultivados o milho e o feijão. Mas a lavoura que apresentou uma grande riqueza para o Patrimônio foi a hortelã menta. Imigrantes japoneses que viviam em São Paulo vieram para cá, desmataram as terras, plantaram o hortelã e montaram alambiques. Depois a família Schlatter aderiu a esta cultura e também montou um alambique.


Transporte da colheita da hortelã menta. 1959
Fonte: Família Linhares Monteiro

              A hortelã dava corte a cada noventa dias, uma produção elevada. Outro fator positivo desta lavoura para o avanço populacional da região era a necessidade de mão de obra. Numa propriedade de dez alqueires de terras, havia trabalho para cinco ou seis famílias. Pois era preciso uma família para cuidar de dois alqueires de hortelã. Até nos terrenos vazios da zona urbana, havia plantações, devido a sua rentabilidade. Tanto no cultivo como na transformação da hortelã em óleo nos alambiques, o trabalho humano era essencial. Itambé chegou a ter mais de quarenta alambiques.

Almabique de hortelã
Fonte: Família Lemos

            Quando o óleo estava pronto, era vendido por um alto preço. O Senhor Osvaldo Henrique dos Santos era produtor de óleo de hortelã e representante da Brasway e da Brasmentol em Itambé e região. Osvaldo comprava o produto dos agricultores e os transportava até a empresa em Maringá. Na cidade de Itambé havia um entreposto de coleta do produto. As empresas usavam o óleo na fabricação de creme dental eoutros produtos de higiene e limpeza. Além disso, o óleo era usado também na produção de medicamentos, como pomadas e cremes para machucados.


Pipas de hortelã do Sr. Bernardino de Oliveira
Fonte: João Naujalis

          A hortelã itambeense também era exportada para Estados Unidos e Japão. Porém o tempo de produtividade desta cultura é curto. Após a derrubada da mata, cultiva-se a hortelã de quatro a oito anos, depois há uma queda nas colheitas. Mas quando isto aconteceu, Itambé já alavancara seu desenvolvimento. O Senhor Osvaldo ainda comercializou hortelã até 1977, buscando-o em outras regiões do Paraná.

Transporte do óleo de hortelã
Fonte: Família Lemos

                                                 O CAFÉ
          O café foi descoberto na Etiópia e difundido para o mundo por meio do Egito e da Europa. De acordo com a Wikipédia, a palavra café vem de qahwa, que em árabe quer dizer vinho. A planta teria sido descoberta por um pastor de ovelhas. Ele observou que os animais ficavam mais espertos quando comiam as folhas e frutos do cafeeiro. Então, sabendo do fato, um monge teria feito infusões com as folhas da planta para ficar acordado nas madrugadas durante suas orações. Em 1727, o sargento-mor Francisco de Melo Palheta trouxe da Guiana Francesa, clandestinamente, a primeira muda de café para o Brasil. E, como já foi mencionado, o primeiro grande produtor de café no Paraná foi Antônio Barbosa Ferraz.  Na colonização, todo o Norte do Paraná produzia café e Itambé seguiu a mesma linha. 
Cafezais de Itambé, Fazenda Primavera
Fonte: Zilda Mancine

          Com o fim da era da hortelã menta, o café tornou-se uma monocultura, cobrindo todas as propriedades rurais itambeenses. Como sua produção necessitava de muita mão de obra, várias colônias formaram-se nas fazendas. Famílias de diversas partes do Brasil migravam para cá a fim de fazer a vida trabalhando com o café.
         O Senhor Argentino Bianchessi, em entrevista às professoras Elisabete Aparecida Moreno e Maria Helena Zampar dos Santos, relatou que o café era cultivado da seguinte forma: plantava-se a semente no solo, numa cova com uns 30 centímetros de profundidade e depois a cobria com lenha. As covas eram feitas a quatro metros de distância uma da outra. Quando a planta nascia, fazia-se a limpeza ao redor dela. A primeira colheita viria quatro anos após o plantio.

Café secando no terreirão. Ao fundo, secador de café
Fonte: Família Moreschi
         
          Inicialmente, tanto o café quanto outros produtos agrícolas eram vendidos a negociantes vindos de fora. De acordo com o relato do Sr. Alcides Benossi, dois deles eram os Senhores Severino e Ernesto Valério que compravam os produtos dos agricultores de Itambé para revendê-los. Gibson Linhares Monteiro e Milton Linhares também compravam feijão e milho, os transportavam pela estrada da Ponte Preta até Maringá e Mandaguari, onde revendiam os grãos. Massakasso Honda comprava a produção dos agricultores, as revendia em Londrina e, de lá, trazia mercadorias para seu armazém de secos e molhados.

Estrada da Ponte Preta, por onde a produção agrícola era escoada
Fonte: Família Meyer.

          O senhor Antônio Pelatti relata que a produção dos cafezais era tão grande que os galhos quebravam pelo peso das cargas. Um vizinho de Pelatti produzia café em oito alqueires, como os galhos já estavam quase quebrando, ele comprou um caminhão cheio de rolos de corda para prendê-los. Pelatti brinca: “Quanta corda nós roubamos para amarrar cabrito!”

Transporte de café, caminhão da Família Lopes
Fonte: Zilda Mancine

         Porém, frequentemente, havia eventos climáticos que atrapalhavam a vida dos agricultores. Em 1953, depois da geada, houve um grande incêndio nos cafezais que ameaçava a todos.
         Vera Eloísa de Melo Assis relatou que, após uma geada que queimou toda lavoura cafeeira, Itambé foi vitima do fogo, em 24 de agosto de 1953. Um grande e terrível incêndio tomou conta da lavoura cafeeira, que iniciava sua primeira colheita. Estas chamas começaram, provavelmente, na região da Água Bonina e se alastrou por diversas propriedades. Como não existiam bombeiros na região, os agricultores se organizaram e foram ao encontro do fogo, nem água havia, a não ser a mina da serraria e dos rios. O fogo foi vencido pelos homens que se dispuseram a combatê-lo, batendo galhos de árvores, na tentativa de apagar. Tudo foi queimado e as chamas ainda invadiram a pequena cidade. Só havia três carros carros, portanto era impossível retirar rapidamente todos os moradores da cidade. O gado e animais de toda espécie morreram.
        Neste dia, estava acontecendo um baile na cidade, chamado Baile das Bolas. As famílias desesperadas reuniram algo que possuíam de mais importância e ficaram prontas para sair. O fogo durou três dias, enquanto havia uma folha seca, ele se arribava. No terceiro dia, a chuva caiu trazendo alento à população.
         Maria Conceição Maldonado dos Santos conta que seu pai, João Maldonado Sanches, morador do Sítio São João, próximo ao Porto Figueira, juntou-se a outros agricultores para tentar conter as chamas. Durante este trabalho, não pôde ver o nascimento de sua filha Maria.
        Essa tragédia destruiu quase todos os cafezais do Patrimônio e região. O Senhor Olímpio Bianchessi se recorda que, naquele ano, ele trabalhava de meeiro, seus cafezais estavam com três anos e dariam a primeira produção no ano seguinte. Mas a geada queimou tudo e foi preciso cortar todos os pés de café e começar tudo de novo. 
            O ex-vereador Jovânio Pereira dos Santos era criança na época e lembra que durante o dia não enxergava quase nada por causa da fumaça, mas a noite ele subia nas árvores para ver a claridade produzida pelos incêndios. Ele disse: “Parecia que o mundo todo estava se acabando em fogo.” Algumas pessoas chegaram a acreditar que já era o fim do mundo anunciado na Bíblia. Com o fim dos incêndios, os agricultores voltaram a cultivar café sem perder a esperança. E a cada dia mais gente chegava a esta região.
         A maior produção de café no Paraná aconteceu na safra de 1961\62. Segundo publicação do jornal O Diário do Norte do Paraná (22-04-2012, pág. E4). O café era o assunto mais falado na região Norte do Estado. Pois a economia de todas as cidades dependia desta lavoura. Nestes anos, o Paraná foi o produtor de mais de um quarto do café mundial. A produção foi de 21,3 milhões de sacas de 60 quilos, o que correspondia a 28% da safra mundial. Porém, em 3 de agosto 1963, houve outra geada, que quebrou a produção. Depois, os cafezais ficaram secos e, no mês de setembro, mais um grande incêndio se alastrou por toda a região.

Safra de café, década de 60
Fonte: Aline Broio Rodrigues Vitorino

       De acordo com o ex-prefeito Antônio Rodrigues Machado e o ex-vereador Alcir Roberto Bianchessi, o fogo durou vários dias, queimando até casas.  As chamas que provinham do município de Doutor Camargo, avançaram por Itambé até além do Rio Keller, devastando tudo pela frente. Um duro golpe para os agricultores.  Em 65 e 66 a produtividade também não foi boa, além disso, a infestação de uma praga, denominada Praga Mineira, estragava as folhas dos cafezais e outra praga atacava os grãos. Com a exigência de café de boa qualidade para a exportação, surgiram os provadores da bebida. Como o café do Norte do Paraná era reprovado nos testes, ele ficava retido nos portos do Brasil. Isto desestimulou os agricultores a continuar nesta lavoura. Outros fatores para o desinteresse, ainda segundo o jornal O Diário do Norte do Paraná, foram os preços oscilantes, a produção desorganizada e a geada. Pelo Brasil correu a notícia de que o Paraná não era um bom lugar para investir e uma frase traduzia o desânimo dos pioneiros, publicada no O Diário, na data já referida: “O Paraná é só enganação. Quando não é geada, é poeirão.”
           O Governo Federal, através do Ministério da Agricultura, percebendo que não compensava comprar este café, já que não haveria um consumidor para ele, fez uma campanha incentivando os cafeicultores a eliminar os cafezais e partir para outras culturas.
          Mesmo assim, muitos agricultores permaneceram com o café. Alguns deles entregavam sua produção na Cooperativa de Cafeicultores de Mandaguari, COCARI, até o ano de 1973 aproximadamente.  Para facilitar o transporte da safra, nesta época, a cooperativa alugou um barracão na cidade, para onde eram levados os grãos. Depois foi construído um cilo para a instalação de um entreposto em Itambé, com recursos do Banco Nacional de Crédito Cooperativo S/A e do Banco Central do Brasil. Sua inauguração foi efetuada em 5 de março de 1975, (mas na placa de inauguração a data que conta é dia 3 de abril de 1976) com a presença do Governador Jaime Canet Junior e o Ministro da Agricultura Alisson Paulinelli. A instalação da COCARI em Itambé gerou grandes benefícios para os produtores rurais, especialmente para os associados que puderam contar com o auxílio de técnicos agrícolas na lavoura.

Inauguração da COCARI
Fonte: Família Moreschi

Inauguração da COCARI, 5 de março de 1975
Fonte: Família Moreschi
         

                                          CRIAÇÃO DE ANIMAIS
             A pecuária não se desenvolveu muito nos primeiros anos de Itambé, o número de animais era considerado pequeno. Pois, a fertilidade e o relevo do solo incentivaram os proprietários a investirem mais na agricultura. A maioria criava animais apenas para o consumo próprio. Entre as criações estavam: gado (leite e corte), suínos, ovinos e galináceos.

Criação de gado
Fonte: Família Moreschi

          De acordo com o ex-vereador Jovânio Pereira dos Santos, os maiores criadores de gado eram os proprietários das fazendas São Sebastião, Santa Margarida, Santo Cecília e Ouro Verde. Na Fazenda São Sebastião havia criação de boi búfalo e na Fazenda Ouro Verde, gado holandês. Além de gado, o Senhor Guilherme Meyer também criava suínos Durok, animais que causavam admiração por serem de grande porte.
           Havia também a criação de gado leiteiro em pequenos sítios para a comercialização na cidade, como o de Kuinto Grigoletto. Ele mudou-se para Itambé em 1951, com sua esposa Jovelina Castaldelli Grigoleto e adquiriu um sítio na Água Ibiúna, denominando-o Sítio Santa Bárbara. Na mudança, ele trouxe dezoito porcos, mas a peste suína matou tudo. Inicialmente tentou cultivar café, devido às geadas, desistiu dessa ideia e decidiu fazer pasto. Começou um rebanho com duas vacas leiteiras e passou a vender leite no Bar do Paulo e em bairros rurais, e assim, trabalhou por vinte e cinco anos.


Sítio da Família Grigoletto
Fonte: Família Grigoletto

          Dona Líbera Bassi Lopes, esposa do ex-prefeito Rafael Lopes, era grande comercializadora de galinha caipira. Ela comprava galinhas dos proprietários de sítios de Itambé e as revendia para o Rio de Janeiro.

                          SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS

          Nem sempre as relações entre proprietários de terras, meeiros ou empregados eram pacíficas. Há, na história de Itambé, inúmeros relatos de desrespeito aos direitos dos trabalhadores rurais. Num caso em especial, um fazendeiro deixou os empreiteiros derrubarem toda a mata e, quando eles começariam a cultivar hortelã, o dono das terras exigia que eles saíssem de sua propriedade sem nenhum tipo de pagamento. Houve uma grande revolta entre os trabalhadores, que cercaram a casa do fazendeiro cobrando seus direitos. Mas ele conseguiu fugir, vendeu as terras e não pagou ninguém.
          Há relatos também de trabalho escravo e maus tratos. Sendo assim, havia a necessidade de um órgão que defendesse os direitos dos trabalhadores rurais, como um sindicato.     

Sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itambé
Foto: Denizia Moresqui

              De acordo com Solange Ferreira de Lima, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itambé surgiu em 1968 com o objetivo de amparar esta categoria. Em 1972, conseguiu a Carta Sindical e passou a ser filiado a Fetaep, Federação dos Trabalhadores da Agricultura. Este órgão fazia e faz a mediação entre patrões e empregados nas divergências trabalhistas. Quando não era possível fazer um acordo amigável, o caso era encaminhado para a justiça e acompanhado pelo advogado Dr. Eli Denis, de Maringá.
         O primeiro presidente foi o saudoso Sr. João Cristino de Freitas, depois assumiu o Sr. Lucindo Ferreira de Lima, que ocupou o cargo por quinze anos. Lucindo era mineiro de Bueno Brandão, chegou a Itambé em 1959 e trabalhou na lavoura, Bairro Catarinense. Ele participou ativamente na criação do Sindicato, foi também vereador.
          Além de atendimento jurídico, havia o odontológico no prédio do próprio sindicato, com o Dr. Luís Tadame Tadashi, que trabalhou por 30 anos no local e faleceu em 2011. O prédio, que era o antigo hospital do Dr. Antônio Godinho Machado, foi adquirido pelo sindicato em 1968 e funciona neste local até os dias atuais.

Cadeira em que o dentista Luís T. Tadashi atendeu os trabalhadores rurais por 30 anos
Foto: Denizia Moresqui

          No primeiro ano de funcionamento, o sindicato contava com 1.000 associados. No fim da década de 70, chegou a 3.800. Segundo Eurípedes Mariano do Silva, a Sindicato tinha até um time de futebol, comandado pelo Sr. Lucindo F. de Lima, com ajuda do Sr. Assis e Antônio Vertuan. Mesmo após a Geada Negra, o número de sindicalizados era grande, pois através do Funrural, Fundo Rural, todo o atendimento à saúde passava pelo sindicato. Segundo Solange F. da Silva, quando o Funrural foi substituído pelo SUS, Sistema Único de Saúde, em 1990, houve uma queda brusca no número de associados, hoje são 400, entre trabalhadores e pequenos agricultores.

Equipe do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itambé
Fonte: Eurípedes Mariano da Silva

          Atualmente, além de análise de contratos e mediações, a instituição oferece serviços dentários, corte de cabelo, auxílio para aposentadoria, atendimento com médico oftalmologista mensalmente. Na época desta pesquisa, o presidente era o Sr. Alcir Roberto Bianchessi que faleceu em 2012. Solange Ferreira de Lima assumiu o cargo.
                                















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O circo no Moreschi

 Bairro Moreschi (Fazenda Anjo da Guarda), local onde, possivelmente, o circo fora montado                                           ...